Não penteia os cabelos e, quando o faz, é para mantê-los desconexos. Desconexidade. Descomplexidade. Desorganização. Sem pudores: seu corpo é sua expressão. Trança os braços por ele, embaixo do chuveiro, enquanto a água desenha gotículas de orvalho sob seus seios, ombros e umbigos. Beija-se... e lá se vão as bolinhas transformadas em lágrimas, correndo da pinta do ombro esquerdo pra desembocar no umbigo, escapar pela virilha, contorcer-se pelo meio das coxas e terminar no calcanhar. Ama-se. Ri-se. Gargalha-se. Chora-se. Borra-se a maquiagem e, eis aí, novamente, mais uma arte de sua expressão. Perfuma-se, abraça-te, beija-lhe os lábios com tanta graça que lembra a ingenuidade de uma criança. Sente o seu cheiro atrás da orelha. Fecha os olhos. Morde os lábios. Dança a língua no céu da boca, segurando entre os dentes qualquer fiasco de tentação. Fiasco. Se precisar, fica na ponta dos pés. Rodopia. Vai e volta. Flutua. Torce o tornozelo. Sapateia no seu desejo. Brinca até se achar suficientemente dona da situação. Pinta o rosto. Veste-se mal, pessimamente mal para a sociedade executiva. Não tem definição do que é ser passional e racional; ela é os dois. Deixa um espaço da sua imaginação pra você e, quando vai embora, dança pra você voltar. Joga um beijo no ar.
Mas o artista revela-se, enfim, quando continua a amar-se em cada pedaço e a cada banho, fadigando sua imaginação astronômica, tirando seu espaço, casando com seus travesseiros e sorrindo, no escuro, de olhos abertos, enquanto o pé direito faz um movimento de pêndulo esfregando-se no pé da cama. Você não voltou, e um artista ainda sabe sorrir.
4 comentários:
Não era pra ser ambíguo, mas deixa estar (assim mesmo).
Acabo de me apaixonar por um texto.
Sorri um milhão de vezes, enquanto lia o seu texto.
Muito bom, Leticia!
Acabo de compartilhar no facebook!
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