Há quatro moinhos de vento plantados em um pedaço meu. O do umbigo sussurra entre as pás o que todos os outros espalham pelo ar: quem é você? E desde que me entendi por qualquer coisa parecida com pensamento, desde que enterro o indicador direito no umbigo, que acaricio o lóbulo da orelha, e que nunca tenha chupado chupeta, pergunto-me o mesmo. Perguntava. Primeiro, à mamadeira; até ela ser substituída pelo copo plástico e, este, pelo de vidro, que acabou numa xícara de café amargo embaixo do sol de uma manhã de inverno paulista. E, enquanto o vento soprava nas quatro pás, perguntava aos próprios dedos: quem são vocês? E, eles, em resposta, namoravam-se entre si: polegar direito com esquerdo, mindinho com anelar, médio com indicador. Procurei, então, qualquer coisa mais pensante que um dedo ou uma mamadeira: apelei à mamãe. Suspirando um sorriso longo, esboçou uma vontade tremenda de satisfazer a minha dúvida, ou a do meu moinho, quem sabe. Levantou-se calmamente, foi até o mamoeiro, levou-o até a cozinha, abriu a fruta no meio e me entregou, dizendo: “tire semente por semente. A cada uma, pergunte ao mamão quem ele é e só pare quando ele te responder”. Indignada, peguei uma colher, raspei as sementes todas de uma só vez e lambuzei-me toda de mamão. Nunca tive paciência pra miudezas melecadas. Desde então, os moinhos se desfizeram de fora pra dentro, derretendo no meu corpo. O do umbigo escorreu como um rio e seus afluentes, achando morada intrauterina. E toda vez que sinto frio, arrepio, ódio, paixão ou como mamão, sei que há um vento gelado soprando em mim. E as hélices só vão parar quando todas as sementes de todos os papayas e graúdos e docinhos acabarem. Daí, quem sabe, eu as encontre em outro lugar, qualquer um que não seja o meu mamão.
Um comentário:
Assim como deve ser teu umbigo,este texto foi profundo,e como o interior do mamão,saiu cheio de caroços,algo assim pode lhe soar esquisito,mas não passa de um elogio,enfim,bela.
abraço !
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