Dia desses, veja você, Sofia enroscou a blusa na janela, enquanto a fechava. Puxou e tudo foi-se desfiando. Emputecida que só ela, esbravejou: “mas que porra é essa?”. A janela ruiu: suas folhas viraram braços; seus braços, bocas e, então, enjanelou seu discurso:
- Eu sirvo pra deixar a luz do dia entrar e pra trazer luar fresquinho, que nem que se fosse saído da boca de Deus. Eu permito que entrem borboletas e passarinhos e baratas voadoras. Eu deixo a vida massagear seu corpo e, enquanto dorme, faço o mundo te assistir de camarote. Por mim sai o velho e entra o novo, e nisso você nem pode mandar!
Antes que Sofia terminasse de começar a entender, olhou pra porta, que, já a postos, abriu os olhos e maçanetou:
- Nem precisa me perguntar. Apresento-me: porta. Eu sirvo pra deixar a pessoa entrar se você permitir e deixá-la partir, se ela quiser.
No embaraçado silêncio dos seus livros e cordas e batons e chapéus, Sofia sentiu um buraco no meio do meio do peito. Abriu todas as janelas da casa e, pela porta, não deixou mais ninguém entrar. Destrancada ficava – pra que quem quisesse ainda pudesse sair.