Escovando os dentes, hipnotizada
pelo movimento rotineiro de vai-e-vem da escova na boca, reparei que dentro da
meia-taça de algodão, preguiçosos, meus seios balançavam. E, por um instante –
um milésimo de segundo – esqueci-me que por baixo daquela pele fina e
branquela, dançava um peito plastificado. Um pra quem sente, dois pra quem vê.
Curiosamente, um outro movimento, esse involuntário, brigava do lado esquerdo
da prótese. Ali, escondidinho atrás de 255ml de volume extra, batia meu
coração. O único batimento em sintonia com o meu corpo, com meu calor, com
minhas confusões. Balançavam os três, entre o canino e o molar, que eu
esfregava freneticamente. Gosto de dentes brancos, hálito fresco, boca limpa e
língua macia. Talvez, estivesse esfregando também o meu ego e meus sentimentos.
Talvez tentasse limpar a sujeira de quem passou por ali e que, ironicamente,
tornou-se a minha própria sujeira. Eu viajava. Espumava de ódio e gozo. Meus
olhos liam no espelho o julgamento que eu fazia das pessoas que, por livre
arbítrio, foram embora de mim – dos meus olhos, dos meus dentes, dos meus
peitos. Eu queria resolver os meus problemas ali, naquele momento. Queria
cuspi-los na pia, ralo abaixo, e deixá-los escorrer pelos canos com a espuma do
creme dental. Não, eu não queria engolir. Eu queria chorar. Queria alguém para
culpar. Queria gritar aos quatro ventos o quão bem resolvida eu sou. Mas minha
boca estava cheia; meus olhos estavam cheios; meu estômago estava cheio e eu
estava farta! Pois não há coisa mais chata do que gente que não sabe o que
quer. Não existe incômodo maior do que a insegurança dos outros. Enquanto isso,
meus seios pulavam. Pareciam querer dizer qualquer coisa que me pudesse calar.
Calei. E entre um ML e outro, entre um batimento e outro, balançando por trás
do sutiã, meus três peitos gritavam: antes de tentar resolver os outros,
resolva-se.